Duane Michals

De 31 de maio até 10 de setembro de 2017 a Fundación MAPFRE apresenta em sua sala de exposições em Barcelona (Casa Garriga i Nogués) uma exposição retrospectiva destinada ao fotógrafo americano Duane Michals.

TEXTO: BLANCA DE LA VÁLGOMA       FOTOS: © DUANE MICHALS

 

Dividido entre a fotografia, a pintura, o teatro e a poesia, Michals é um dos nomes de maior importância da vanguarda norte-americana. Nos anos sessenta propôs uma nova abordagem fotográfica que não pretendia documentar a realidade tangível, o “momento decisivo”, com o qual seus contemporâneos tanto se preocupavam, como ocupar dos aspectos metafísicos da vida. Desta maneira, Michals afastou-se da fotografia como instrumento da memória visual: o que não se pode ver, o que permanece oculto, se converte no objetivo de sua busca.

Nascido em McKeesport, subúrbio de Pittsburgh, em 1932, Michals estudou arte na Universidade de Denver e desenho na Parsons School of Design de Nova York. Descobriu a fotografia em 1958 quase que por casualidade, durante suas férias na União Soviética, quando levou consigo a câmera de um amigo. Aprendeu a dizer em russo “Posso tirar uma foto sua?” e começou a realizar retratos singelos e diretos que atingiram um grande sucesso quando o artista, após a sua volta a Nova York, decidiu expô-los, o que lhe incentivou ainda mais a se dedicar ao que seria sua grande paixão e que converter-se-ia no eixo de sua vida: a fotografia.

René Magritte (Profile and Full Face), 1965 [René Magritte (de perfil y de frente)] Carnegie Museum of Art, Pittsburgh The Henry L. Hillman Fund, 2009.31.2 © Duane MichalsO próprio artista afirma que teve a sorte de nunca ter estudado fotografia, o que lhe permitiu se afastar das práticas habituais sem se preocupar em absoluto pelos limites auto impostos pela fotografia tradicional. Da mesma maneira, suas referências estéticas mais relevantes não são fotógrafos, mas três pintores: René Magritte, Balthus e Giorgio de Chirico, aos que conheceu e retratou, e que determinaram sua liberdade, seu caráter lúdico e sua visão cenográfica. O único fotógrafo que verdadeiramente lhe serviu de inspiração foi Eugène Atget, cujas vistas de Paris próximas ao surrealismo deram lugar à primeira série de importância realizada por Michals, Nova York vazia.

As séries têm um grande protagonismo na obra de Duane Michals. Nos anos sessenta começou a trabalhar com sequências, formadas por várias fotografias cuidadosamente construídas, que juntas formam uma história. Com estas sequências consegue superar os limites da imagem individual, que julga insuficientes para expressar seu mundo interior, e criar narrações nas quais o inesperado costuma ser o protagonista. Estas histórias permitem-lhe refletir sobre os grandes temas que lhe preocupam, como a morte, o amor, a sexualidade ou a percepção, muito frequentemente através do humor, da surpresa e do jogo.

Outra das grandes renovações da linguagem fotográfica propostas por Duane Michals foi incluir textos escritos à mão sobre suas cópias positivadas, rompendo assim com a fama de que “uma imagem vale mais que mil palavras”. Estes textos, que muitas vezes são verdadeiras obras poéticas, constituem um complemento do que não pode ser visto na imagem, mas que deve ser contado e compartilhado, um elemento fundamental para o entendimento total da obra. Através deles, expressa sua ideologia política em fotografias como O negro é feio ou O homem azarado, mas também expõe seus sentimentos mais íntimos, como em Uma carta de meu pai, e seus pensamentos filosóficos mais profundos, como na série Perguntas sem resposta.

I Hold Plaster Dust from the House in My Hand…, 2002 [Sujeto polvo de escayola de la casa en mi mano. Cortesía de DC Moore Gallery, Nueva York © Duane Michals

Duane Michals reutiliza e combina em numerosas ocasiões diferentes recursos com a intenção de traduzir seus sentimentos da maneira mais precisa possível. Assim, por exemplo, utiliza da inclusão de textos junto à sobreposição de imagens, outra de suas técnicas usuais, para refletir sobre a memória, suas origens e a família em uma de suas séries mais pessoais, A casa que uma vez chamei de lar. Nestas fotografias, resultado de uma visita à casa já destruída de sua infância, ocorrida em 2002, o artista evoca a história de sua família com imagens antigas que se sobrepõem às contemporâneas, acompanhando com versos o relato das personagens e os lugares.

Frente a esta vertente mais profunda e severa de sua obra, muitas de suas fotografias estão caracterizadas pelo humor e pela ironia. Sua linguagem zombadora atinge níveis verdadeiramente hilariantes na série dedicada à arte contemporânea. Através de diversas fotografias nas quais imita a vários dos artistas contemporâneos mais conhecidos e apreciados, Duane Michals faz uma divertida, mas afiada, crítica ao mercado da arte contemporânea, onde a palavra do crítico dispara a cotação de obras pouco significativas por si mesmas e onde os formatos de grande tamanho tentam camuflar a falta de conteúdo.

Precisamente, a fim de não depender do mercado da arte, Michals desenvolveu ao longo de toda sua carreira, em paralelo a sua obra mais pessoal, uma intensa atividade como fotógrafo profissional. Nestes trabalhos mais comerciais, unidos ao mundo da publicidade, e nos retratos de um grande número de personalidades do mundo da cultura e da arte, realizados a pedido de revistas famosas, Michals adiciona seu carácter e seu estilo, convertendo-as em autênticas obras de arte. Estes trabalhos permitiram que Michals desenvolvesse seu trabalho mais pessoal com a máxima liberdade, sem a necessidade de se submeter à pressão de que sua obra obtivesse um sucesso comercial.

Com 84 anos, Duane Michals segue criando, inventando formas e novos recursos com os quais pode se expressar. Assim, nos últimos anos, começou a produzir uma série de obras coloridas positivadas em forma de leque, se inspirando na tradição popular japonesa do Ukiyo-e, a fim de explorar a enigmática natureza flutuante da vida contemporânea. Neste projeto Michals, segue reinterpretando velhos hábitos, onde sobrepõe ícones e palavras feitas à óleo. Nos últimos dois anos, também tem se dedicado à direção de curtas-metragens de sete minutos de duração que supõem uma deriva natural de suas sequências e são compostos por muitas de suas invenções formais e pelos grandes temas que percorrem toda sua obra.

 

Mais Informação

Para celebrar esta exposição, foi publicado um catálogo com três edições (castelhano, catalão e italiano) que inclui um ensaio feito pela curadora, Enrica Viganò, trechos de uma entrevista inédita com Duane Michals realizada em Dezembro de 2016 e um texto do filósofo José Luis Pardo, ganhador do Prêmio Nacional de Ensaio. A publicação também inclui imagens de todas as obras da exposição, bem como uma cronologia do artista feita por Irene Núñez.